segunda-feira, 11 de maio de 2020

A escola, a mercantilização da educação e a manutenção das desigualdades sociais



#adiaenem2020



Como sempre falo para os meus alunos de graduação e colegas professores é preciso entender o que é Educação. É preciso compreender o modelo de educação que fazemos. É preciso compreender a escola que criamos.
É preciso entender qual é a função social da educação!
Isso, a função social da educação!!!!!!!!
Eu vou tentar explicar para quem não entendeu os motivos pelos quais o adiamento do ENEM é NECESSÁRIO.
Pensemos, aqui no Brasil, a escola a partir da época dos jesuítas, ok?
Colonização portuguesa, escravização de africanos e dos povos originários... Elite e os reles mortais.
Os reles mortais somos nós. A maioria de nós.... Pobres, pretos, marginalizados por um sistema, fundamentalmente, opressor.
Por um sistema que fala sobre méritos em um cenário discrepante de oportunidades..... É a tal da meritocracia.

Mas vamos lá, a escola lá nos tempos dos clérigos (jesuítas) foi criada para reproduzir a ideologia da elite – A ideologia dominante. Foi criada com a intenção de DOMAR.
Quando se fala nesse tipo de escola talvez você nem imagine que a disposição das carteiras ainda utilizada nas escolas atuais é a mesma da escola jesuítica.
Essa posição que você só consegue ver a nuca do colega da frente e ainda o professor em cima de um “palco” tem a intenção de fazer você acreditar que seu professor é o detentor de todo o conhecimento e por isso tudo o que ele fala deve ser seguido por você.  Nessa perspectiva, o conhecimento não é construído pela interação social.
Sobre ver somente a nuca do seu coleguinha.... Você não interage com ele, então, você está sozinho. E sozinho, você tem medo de discordar, de questionar, de tentar modificar..... É melhor assim, você esta sendo dominado!
Foi pra isso que a escola foi criada. Para servir como um instrumento de dominação das classes. Para reproduzir a ideologia dominante.
Com isso o aluno é considerado vazio de conhecimento. Vazio de saber. Vazio de história. Vazio de experiência.
A escola importa para o aluno e o aluno não importa para a escola.
Essa é a lógica que a elite quer manter até hoje.
A educação, pela Constituição Federal de 1988, é direito de todos... A educação pública de qualidade!
Para fazer educação de qualidade, precisamos de qualidade nas condições de trabalho, precisamos de qualidade na formação de professores, precisamos de qualidade de vida para que possamos conseguir transformar nossos saberes.
Perceba,
Com fome ninguém aprende!
Com fome ninguém ensina!
Tendo que dar aulas para inúmeras turmas para sobreviver, ninguém consegue ensinar e aprender.
As condições precárias do trabalho docente, na escola pública, fazem parte de uma estratégia de destruição da educação de qualidade, por parte da elite.

A educação básica, pela Lei das Diretrizes e Bases da Educação (LDB), deve formar um cidadão que tenha criticidade e capacidade de tomar decisões na sociedade a partir de um conjunto de conteúdos mínimos que devem ser aprendidos na escola, mas....
A escola é um lugar de adestramento. Principalmente as escolas particulares.
Lá não existe a preocupação de formar um cidadão.
Lá a intenção é a reprodução mecânica de exercícios que servirão para que o aluno ingresse na universidade pública.
Universidade pública que tem sido conhecida ultimamente, pela boca da elite, como local de suruba, orgia e vagabundagem.
A universidade pública, na boca da elite, não presta. Até que seus filhos atinjam idade para ingressar em uma.
É essa parte da população que não quer que o ENEM seja adiado. Mas é claro! Vou te dizer os motivos:
1) A elite está tendo aula normalmente durante a pandemia. As escolas particulares não pararam. Estão obrigando seus professores a lecionar a distância. Os professores, nós professores, não temos muitas escolhas. É preciso comer... então, muitos estão dando aula. Não importa para elite a que custas!
2) O filho da elite está tendo acesso a todo o conteúdo que será cobrado no ENEM. Ele tem acesso à internet numa velocidade incrível, inclusive.
3) O aluno da escola pública, não está tendo aula. Ele não tem acesso à internet, em sua maioria. As tentativas ABSURDAS das secretarias de educação estaduais de promover essa modalidade de ensino (à distância) são inexpressivas e não tem o objetivo de dar certo. O problema é muito maior que o acesso à internet. O problema está nas panelas. O problema está na falta de dignidade da pessoa humana. O pobre não tem vez para a elite... os patriotas.... os da família tradicional brasileira, sabe?!
4) O aluno da escola pública, que não é filho da elite, que é marginalizado, não está tendo acesso ao conteúdo do ENEM. Você entende o que isso significa?!
Ele não vai conseguir ter êxito na prova. Ele não vai ingressar em uma universidade pública. Ele não tem dinheiro para pagar uma faculdade particular.
Já é difícil conseguir dar acesso ao conteúdo do vestibular em tempos de aula presencial, imagina em tempos de pandemia.
É daí também que surge a necessidade de entender a importância das políticas de cotas.... Mas isso é assunto para outro texto!
Voltando ao aluno pobre, da escola pública....
O que resta para ele?
A política já estabelecida há muito tempo que tem a seguinte ideia:
“Sucesso escolar” para alunos da rede privada e “Fracasso escolar” para alunos da rede pública.
Aqui a discussão sobre sucesso e fracasso está minimizada em somente um ponto: o ingresso à universidade pública.

Jogam sobre as costas de nós pobres a culpa de um fracasso que não é nosso.
Jogam sobre as costas de nós pobres a culpa de um fracasso mantido pela elite.
Jogam sobre as costas de nós pobres a culpa de um fracasso que é do sistema.

São as práticas neoliberais rasgando nossas vidas, nossos corpos, nossas existências.

E nós, professores de instituições públicas, continuaremos seguindo para tentar mudar essa realidade. Ainda não sabemos como, mas como uma amiga, da Sociologia, sempre me diz: “O dilema moral já é um começo!”

Por fim, serei claro e peço que vocês também sejam. Repitam comigo:


#ADIAENEM2020


4 comentários:

  1. Parabéns pelo texto, Victor!!! �� Lembrei também daquela (falta de) lógica do dominado que deseja se tornar dominador...essa roda só poderá ser quebrada com consciência de classe. Mantenho a esperança na função social da educação, como bem destacou!

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  2. Mais um excelente texto que precisa alcançar muitos lares!!!

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